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iFood Loop: como a startup de refeições quer ‘digitalizar o PF’

Presidente executivo do iFood, Fabrício Bloisi tem um objetivo claro na cabeça: fazer as pessoas pararem de perder tempo em frente ao fogão. Sua meta é entregar comida em qualquer lugar, a qualquer hora e em qualquer tipo de refeição. Para a estratégia dar certo, a empresa precisa ir além das pizzas e lanches que fizeram sua fama, apostando no arroz e feijão nosso de cada dia. O primeiro passo nesse sentido foi dado com a criação do Loop, um serviço de entrega de marmitas para a hora do almoço. Disponível em 40 cidades brasileiras, a plataforma oferece refeições a partir de R$ 10 e já realiza uma média de 650 mil pedidos por mês.

Presente em uma aba dentro do app do iFood, o Loop oferece 60 pratos diferentes, de segunda a sexta. Em cada região, porém, há apenas 30 opções, cuja disponibilidade varia de acordo com os restaurantes mais próximos. A base do menu não difere muito do clássico prato feito (ou “PF”): há carne acebolada, linguiça e frango grelhado, acompanhados de arroz e feijão. Mas há também pratos mais elaborados, como estrogonofe, bife à parmegiana ou frango com batata doce.

Para pedir um Loop, porém, é preciso agendar a entrega do pedido com antecedência de algumas horas no app. Para receber a comida, há quatro horários disponíveis, entre 11h e 14h. Não há taxa de entrega, nem identificação do restaurante que fez a comida – tudo chega em uma embalagem específica, com o selo do programa.

“O Loop permite que as pessoas recebam refeições saudáveis, em casa ou no escritório, pelo preço de marmitas de rua”, explica Mauro Piazza, diretor do serviço no iFood, em entrevista ao Estado. Para produzir os pratos, o iFood usa uma rede de 300 restaurantes parceiros – muitos deles são estabelecimentos que também atendem fregueses em seus salões. “Escolhemos aqueles que têm capacidade para produzir muito”, diz Piazza.

A ideia atraiu Claudia Carrasco, dona de seis restaurantes em São Paulo. Hoje, um deles trabalha de portas fechadas só para atender o aplicativo. “Produzo cerca de 500 refeições por dia para o Loop”, diz a empresária.

Ataque à marmita

Três públicos diferentes são alvo do Loop. O primeiro deles é quem gasta o vale-refeição (VR) todo dia para almoçar durante o expediente. O segundo é trazer de volta para as refeições pagas quem se acostumou a levar marmita para o trabalho – uma tendência no mercado de alimentação. “É algo difícil de mensurar, mas há uma tendência de procura por refeições diárias mais baratas ou mais saudáveis”, afirma Sérgio Molinari, diretor da consultoria especializada Food Consulting.

Aqui, entram na conta dois fatores: a crise econômica recente, que levou muita gente a cozinhar em casa para economizar o VR, bem como o aumento do mercado fitness – hoje, há grande movimentação de ‘marmitas saudáveis’ em canais digitais como o WhatsApp e o Instagram.

Mas, na visão de Molinari, o Loop também pode ser a porta de entrada de um novo tipo de pessoas para as refeições por entrega: o público das classes C e D. Segundo ele, tradicionalmente quem mais consome comida por delivery no País são as classes A e B – que podem pagar por refeições que vão além do arroz com feijão, com valor de “marca” e taxa de entrega. “Hoje, serviços como o iFood só atendem um terço da população. O restante oferece uma oportunidade gigantesca”, diz o especialista.

Fermentação

O projeto Loop existe dentro da Movile, dona do iFood, há tempos. Sua idealização começou no Rapiddo, um aplicativo de entregas que também pertence à empresa, em abril de 2018. Só chegou ao iFood quatro meses depois – e desde então foi sendo construído pela empresa.

Nesse meio tempo, segundo apurou o Estado, a startup de entrega de refeições chegou a cogitar a ideia de construir suas próprias cozinhas para produzir as marmitas do Loop, mas desistiu do plano para focar nos seus pontos fortes – logística e tecnologia. Procurado, o iFood nega esse projeto e diz que a ideia sempre foi fomentar os restaurantes.

Na visão da empresa, só neste início de 2020 o Loop ficou maduro para sair da “fase beta”. É um reflexo do próprio crescimento do iFood nesse intervalo: em novembro de 2018, a empresa levantou uma rodada de aportes de US$ 500 milhões, o que a levou a ser considerada um unicórnio – avaliada em mais de US$ 1 bilhão.

Com os recursos, a startup de entregas acelerou seu desempenho: saltou de 14,1 milhões de pedidos por mês, em janeiro de 2019, para 26,6 milhões de entregas no mês passado. A base de restaurantes, por sua vez, subiu de 55 mil para 131,3 mil no País todo. O crescimento também mudou o foco interno da Movile: presidente executivo da holding, Fabrício Bloisi passou a liderar também o iFood em novembro de 2019.

Faca de dois gumes

Para Piazza, que comanda o Loop, os segredos do serviço são a produção em larga escala e o aproveitamento da ociosidade ou do excedente de comida feita pelos restaurantes. O discurso é usado pela empresa para atrair os parceiros, uma vez que a margem de lucro por prato no Loop, recebida pelos estabelecimentos, é menor que a de refeições normais do iFood – questionada, a startup não especificou números.

Para fazer milhares de refeições chegarem ao destino, a empresa também precisou trabalhar na logística. Uma das novidades do Loop é um sistema de inteligência artificial que organiza os pedidos, distribuindo as refeições para os restaurantes mais convenientes e os entregadores mais próximos. A ideia é que os parceiros da empresa levem vários pratos em cada viagem, até mesmo em locais próximos ou no mesmo escritório, para otimizar seu tempo. Em troca de darem conta da complexidade, os entregadores recebem comissões maiores quando levam uma refeição do Loop – um sistema de organização já usado por outros apps do setor, como a Loggi.

Por outro lado, o Loop também nasce com desafios. Um é a quantidade de reclamações que o iFood recebe por problemas na entrega ou no pagamento. No site de defesa do consumidor ReclameAqui, o iFood só perde para a loja online da Americanas em número de queixas nos últimos seis meses. Na média, são 285 demandas por dia. “O Loop deve herdar os problemas que o iFood tem hoje”, afirma Silvio Laban, professor do Insper. Em resposta, a startup afirma que tem índice “ótimo” no site, com 83% das reclamações já sendo resolvidas no primeiro contato.

Outro desafio do novo serviço é a padronização da comida: apesar de todas as refeições chegarem ao consumidor sob a marca Loop, nem sempre o prato é igual. Em testes feitos pela reportagem em diferentes bairros de São Paulo, houve diferença na qualidade dos ingredientes e do tempero utilizado.

Para diminuir o problema, a startup criou a Universidade Loop, um portal que reúne vídeos de culinária e também avisos sobre o dia a dia das operações, como novos pratos do cardápio e horários especiais para feriados. A dona de restaurante Claudia, porém, disse não conhecer a plataforma. “O que fazemos mesmo é medir a quantidade de comida exata, para não ter diferença. A cada 15 dias, também há uma inspeção para checar se estamos fazendo tudo certo”, diz ela.

Para o futuro do Loop, o iFood não tem planos exatamente concretos – um deles é colocar comida na mesa de mais pessoas. “Por enquanto, queremos aumentar o número de pedidos e expandir o serviço para mais cidades”, diz Piazza. O outro é ir além do arroz e feijão, explorando novos pratos e temperos: segundo o executivo, já há testes-piloto do Loop no México e na Colômbia.

Com informações do jornal O Estado de S.Paulo
Foto: reprodução