Há exatos dois anos, a BRF iniciou uma trajetória para recuperar a confiança do mercado de capitais. Com altos e baixos desde então, a empresa ainda não cumpriu esse roteiro, que conta agora com o desafio adicional da Covid-19.
Desde o início da escalada global da pandemia, no fim de fevereiro, o valor de mercado da BRF teve uma retração de 38%, para R$ 15,22 bilhões, segundo a consultoria Economatica.
Com a perspectiva de que os reflexos do coronavírus comecem a ser sentidos, de fato, neste trimestre, a companhia já está tomando ações para se resguardar. “Para garantir a nossa capacidade de produção, nós iniciamos a contratação de 5 mil funcionários”, afirmou Lorival Luz, em teleconferência com analistas realizada nesta segunda-feira, 11 de maio.
Segundo o executivo, a estratégia visa compensar uma potencial redução em seus quadros por conta de fatores como o absenteísmo de trabalhadores, em virtude de contaminações. Ao mesmo tempo, Luz cita as eventuais medidas restritivas tomadas por autoridades e governos.
Em outra medida nessa direção, a empresa diz estar monitorando e redistribuindo, se preciso, a produção. Nessa vertente, por exemplo, em um caso anterior à Covid-19, a empresa redirecionou a produção das unidades de Dois Vizinhos e Francisco Beltrão, no Paraná, para outras plantas habilitadas no País.
As duas estruturas operavam com exportações para a Arábia Saudita que, em janeiro, suspendeu as importações de carnes de frango de alguns frigoríficos brasileiros.
As aquisições são outra frente para minimizar esses efeitos. Na sexta-feira, 8 de maio, a BRF anunciou a aquisição de 100% da Joody Al Sharqiya Food, companhia saudita de processamento de alimentos, por cerca de US$ 8 milhões.
Com o acordo, a empresa passará a produzir na Arábia Saudita, dentro de um portfólio que inclui cortes de produtos como empanados, marinados e hambúrgueres. A companhia planeja investir US$ 7,2 milhões para expandir a capacidade atual da unidade de 3,6 mil toneladas/ano para 18 mil toneladas/ano.
Já no que diz respeito à demanda, Luz entende que a recessão esperada em todos os mercados traz boas perspectivas. “Isso beneficia os nossos produtos, especialmente, a proteína de frango”, disse. “Nesse ambiente de recessão, a tendência é que a população busque fazer valer mais seus recursos.”
No mercado internacional, o executivo também destacou que a demanda do mercado chinês seguirá robusta, por conta da peste suína africana, que impactou o rebanho do país asiático e vem abrindo espaço para mais proteínas, de outros países. No primeiro trimestre, os volumes da BRF destinados à China cresceram 89,5%.
Em alta
Se o coronavírus coloca alguns pontos de interrogação na capacidade de retomada da BRF, os números relativos ao primeiro trimestre, divulgados na noite deste domingo, tiveram uma boa resposta do mercado.
As ações abriram o pregão desta segunda-feira na B3 em alta de 5%, que subiu para a casa de 13% ao longo da manhã. Os papéis fecharam o dia com uma valorização de 11,26%, cotados a R$ 20,85.
A empresa reportou um prejuízo de R$ 38 milhões entre janeiro e março, contra R$ 113 milhões, um ano antes. A BRF atribuiu a perda no primeiro trimestre de 2020 a dois fatores: o primeiro deles foi o acordo de R$ 204 milhões para encerrar uma ação coletiva de investidores nos Estados Unidos, relacionada aos impactos nas ações por conta da operação Carne Fraca.
O segundo efeito veio da variação cambial sobre o endividamento da companhia em moeda estrangeira. Esse elemento também impactou a dívida líquida, que saiu de R$ 13,3 bilhões, no fim de 2019, para R$ 15,5 bilhões, com a cifra representando 2,68 vezes o Ebtida ajustado no período, acima da relação de 2,5 vezes registrada ao término do ano passado.
Nesse ponto, porém, a BRF destacou uma geração de caixa operacional no trimestre de R$ 1,5 bilhão e o equacionamento do prazo médio de suas dívidas de 3,1 para 4,5 anos. Além do fato de que os vencimentos em moeda estrangeira agora estão programados para começar em meados de 2022. “Temos uma liquidez de R$ 10,5 bilhões”, disse Luz, referindo-se ao caixa de R$ 9 bilhões e o acesso a uma linha de crédito rotativo de R$ 1,5 bilhão.
Outros indicadores do primeiro trimestre envolvem o crescimento de 21,6% na receita líquida, para R$ 8,9 bilhões, puxado pelo avanço nas vendas em todos os mercados. Com uma receita líquida de R$ 4,65 bilhões no período, alta de 18,1%, impulsionada pela categoria de processados, o Brasil foi um dos destaques. No mesmo indicador, no mercado internacional, o salto foi de 25,6%.
Em relatório, o BTG Pactual destacou o trimestre “muito forte”, com a execução mais forte que o esperado em mercados como o Brasil e a demanda sólida na Ásia.
“A combinação de resultados mais fortes do primeiro trimestre, com alguns sinais positivos, e a depreciação do real deve gerar atualizações nos ganhos em 2020. Isso, por si só, deve significar uma reação positiva ao preço das ações”, escreveram os analistas Thiago Duarte e Henrique Brustolin. Eles ressaltaram, no entanto, uma preocupação acerca da manutenção, para os próximos trimestres, das fortes vendas no varejo observadas recentemente.
A XP Investimentos, em relatório da analista Betina Roxo, também ressaltou os indicadores acima das expectativas reportados pela BRF, em todos os mercados, e manteve a recomendação de compra do papel.
Informações do portal Neofeed.
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