Na última segunda-feira (14), o céu não foi o limite para a agricultura brasileira. Um voo suborbital da Blue Origin levou ao espaço não apenas uma tripulação composta exclusivamente por mulheres — entre elas a cantora Katy Perry e a astronauta e ex-cientista da NASA Aisha Bowe — mas também sementes e mudas de alimentos com DNA brasileiro.
A bordo da cápsula New Shepard, lançada do Texas (EUA), estavam sementes de grão-de-bico da cultivar BRS Aleppo e plantas de batata-doce das cultivares Beauregard e Covington. Todas fazem parte de programas de melhoramento genético desenvolvidos e mantidos pela Embrapa. A missão, batizada de NS-31, durou cerca de dez minutos e marcou mais um passo rumo à produção de alimentos em condições extremas — dentro e fora do planeta Terra.
Pesquisas que conectam o campo ao cosmos
Essa missão é parte das ações da Rede Space Farming Brazil, uma iniciativa da Embrapa em parceria com a Agência Espacial Brasileira (AEB). O foco? Desenvolver sistemas produtivos capazes de gerar alimentos em ambientes como a Estação Espacial Internacional, a Lua ou até mesmo Marte, onde os desafios incluem radiação intensa, baixa gravidade e ausência de solo.
A presença brasileira foi viabilizada por um convite da Winston-Salem State University (EUA), com apoio da empresa Odyssey, especializada em ciências espaciais. As espécies escolhidas — grão-de-bico e batata-doce — foram selecionadas por sua adaptabilidade, valor nutricional e potencial de cultivo em condições adversas.
Segundo Larissa Vendrame, engenheira-agrônoma da Embrapa Hortaliças, a batata-doce se destaca pelo alto teor de carboidratos de baixo índice glicêmico, pelas folhas ricas em proteínas vegetais e pelos compostos antioxidantes presentes nas raízes — um trunfo valioso frente à radiação cósmica.
Do espaço para o campo brasileiro
Apesar da missão espacial, o impacto dessa pesquisa tem os pés bem fincados no solo brasileiro. O grão-de-bico BRS Aleppo, por exemplo, é uma cultivar da Embrapa conhecida por seu alto teor de proteínas e excelente desempenho agronômico em condições restritivas, como baixa disponibilidade de água e nutrientes.
“A missão pode acelerar o melhoramento genético ao identificar variações induzidas pela exposição ao ambiente espacial”, explica o pesquisador Fábio Suinaga. A expectativa é obter plantas mais produtivas, compactas e resilientes — características cada vez mais demandadas nas lavouras nacionais, especialmente em tempos de mudanças climáticas.
Inovação com efeito multiplicador
A coordenadora da rede, Alessandra Fávero, destaca que o projeto também tem potencial para gerar spin-offs tecnológicos com aplicações práticas no agronegócio. Tecnologias desenvolvidas para o espaço, como sensores, inteligência artificial e técnicas de cultivo indoor, podem ser adaptadas para melhorar a eficiência e a sustentabilidade da agricultura em solo brasileiro.
“Queremos que o agro se beneficie do que está sendo criado para além da Terra. A NASA já transformou tecnologias espaciais em soluções do dia a dia — nosso objetivo é fazer o mesmo para o campo”, afirma.
As amostras vegetais retornarão à Terra para avaliação dos cientistas brasileiros, que acompanharão as possíveis alterações genéticas e fisiológicas. A expectativa é que essas descobertas contribuam com soluções inovadoras, tanto para as futuras missões espaciais quanto para a produção de alimentos mais eficiente e sustentável aqui no planeta.