A Câmara Municipal de Nova York aprovou por maioria uma lei proibindo a venda de foie gras na cidade, um dos maiores mercados do produto no país, a vigorar a partir de 2022.
Nova York junta-se assim à Califórnia no banimento ao fígado inchado de pato ou ganso, com a justificativa de se coibir a crueldade com animais. “Nova York é a meca da culinária mundial. Como é possível que não tenha mais foi gras?”, pergunta Marco Moreira, chef e dono do Tocqueville, um aclamado restaurante perto da Union Square que serve um tira-gosto de foie gras produzido no Vale do Hudson. “Que virá sem seguida – proibição de vitela? De cogumelo?”
A maior parte do foie gras é produzida por meio de um processo conhecido como gavage. Gansos e patos são forçados a comer uma mistura rica em gordura, à base de milho, que faz inchar seus fígados. O processo requer a inserção de um tubo na garganta da ave durante 20 dias, fazendo o fígado aumentar dez vezes de tamanho. Isso pode deixar a ave gorda demais para caminhar ou mesmo para respirar (até ser abatida).
Carlina Rivera, vereadora de Manhattan que apresentou a lei do foie gras, diz que a medida impede “o processo mais desumano” existente na indústria de alimentos. “A alimentação forçada é extremamente violenta e tem por objetivo um produto puramente de luxo”, afirma ela.
Para fazendeiros que produzem foie gras, a alimentação forçada não é cruel e as acusações de” tortura” são exageradas. Segundo eles, há um preconceito contra o foie gras por ser um produto de luxo.
Outros países, como Índia, Israel e Grã-Bretanha, já baniram a venda ou produção de foie gras. A rede de supermercados americana Whole Foods deixou de vender o produto em 1997, em apoio ao fim da crueldade com animais. A Postmates, que entrega encomendas pelo correio, deixou de entregar foie gras em 2018.
Em Nova York, trava-se uma batalha crítica, onde uma milionária cultura de extravagância faz crescer a procura por foie gras há décadas. A tradição, no entanto, cedeu a uma Câmara Municipal cada vez mais progressista.
A nova lei proíbe a venda de foie gras produzido “com alimentação forçada de aves”. Cada violação acarretará uma multa de US$ 2 mil. Mas, como nem todo foie gras vem de gansos alimentados à força, determinar qual foie gras é produzido legalmente pode se transformar num desafio jurídico.
Cerca de mil restaurantes em Nova York têm foie gras no cardápio. O impacto maior, no entanto, deverá ser sentido nas fazendas e sítios ao norte de Nova York que produzem foie gras.
A Hudson Valley Foie Gras e a La Belle Farm, no condado de Sullivan, dizem que empregam 400 pessoas, e 30% de seu faturamento vem de Nova York. A Hudson Valley, que abate 800 aves por dia, informa que vendeu US$ 1,5 milhão em foie gras no ano passado.
Um fígado inchado de 90g pode ser vendido por US$ 125; ossos e penas de gansos que produziram foie gras são usados em outros produtos, como ração canina e casacos, diz Sergio Saravia, fundador da La Belle e líder do Catskill Foie Gras Collective.
“Para nós foi devastador, pois Nova York e Califórnia eram nossos maiores mercados, diz Saravia, acrescentando que sua fazenda perdeu US$ 50 mil por semana com o fim do mercado californiano. “Está ficando difícil continuar”, lamenta.
Rivera diz que o projeto de lei original foi suavizado para ajudar os fazendeiros. A proibição só entrará em vigor três anos após tramitar, o que permitirá aos produtores ajustarem-se a novos modelos de negócios. A multa máxima subiu de US$ 1 mil para US$ 2 mil, mas uma proposta que previa até um ano de prisão para os desobedientes foi eliminada.
Rivera rejeita a ideia de que o banimento irá inviabilizar a sobrevivência dos fazendeiros do setor. “Essas fazendas produzem dezenas de outros produtos e gavage é um processo agressivamente cruel”, diz a vereadora. “Quando houve a proibição de circos exibirem animais em Nova York, as pessoas não deixaram de ir ao circo”, compara.
Mais da metade da Câmara de Nova York, de 30 membros, votou a favor da lei do foie gras, que é parte de um pacote de leis contra a crueldade com animais que seus defensores consideram “das mais significativas aprovadas em Nova York nos últimos anos”
Outras leis do pacote proíbem que cavalos puxem carruagens em dias úmidos e a captura de aprisionamento de pombos. Essas aves às vezes são capturadas e levadas para fora do Estado para serem usadas no tiro ao pombo.
Com informações do jornal The New York Times
(Foto: reprodução)